quarta-feira, 26 de agosto de 2009

De repente, No Último Verão (Suddenly, Last Summer) – 1959

Grande parte da genialidade do diretor Joseph L. Mankiewicz se encontra em escolher roteiros de impacto para seus filmes. A Malvada tem um roteiro tão fantástico quanto às suas atuações. De repente, no último verão não é diferente. Baseado na peça de Tennessee Williams, a história causa impacto, choca e até mesmo diverte em certos momentos (Risadas de pena, como diz Barbra Streisand).

À priori, a loucura nos é mostrado como tema principal da obra. No entanto, o interesse que move todos os personagens se mostra muito mais importante. O interesse do jovem médico, Dr. Cukrowicz (Montgomery Clift), em validar e creditar sua nova cirurgia; o interesse do diretor do hospital estadual, em arrumar um investidor para quitar as dividas do hospital e aplicar em recursos para o mesmo; o interesse de Violet Venable (Katharine Hepburn) em esconder os segredos de seu falecido filho; o interesse financeiro Grace e George e até mesmo o interesse da jovem Catherine (Elizabeth Taylor) em sair do manicômio.

Assim como em Rebecca (1940), o personagem principal não se encontra no filme, mas todas as suas características, seu gênio, e ao longo da película, seus segredos, são revelados de tal forma que conseguimos vê-lo com perfeição, como se realmente estivesse atuando. Assim é o falecido Sebastian: um jovem poeta, rico que tem uma relação bastante estranha com sua mãe. Todo verão, os dois viajam juntos para países exóticos, onde o jovem termina seu único poema que estivera construindo ao longo do ano. De repente, no último verão, Sebastian decide deixar sua mãe e levar sua prima, Catherine para viajar consigo.

O poeta morrera no último verão, e Catherine ficou louca. O jovem médico é então chamado pela mãe para realizar a cirurgia de Lobotomia na sobrinha, que de acordo com ela, está precocemente demente. O jovem é claro, se apaixona pelos encantos da moça que está realmente transtornada (Era um filme dos anos 50, tinha que ter alguma paixão mesmo o filme mais dramático ou assustador. Vejam Lugar ao Sol). Descobertas são feitas e a loucura troca de papéis.

Na minha forte interpretação do filme, Sebastian era gay e muito tímido. Por este motivo, utilizava sua mãe e, no útlimo verão, sua prima para chamar a atenção de jovens excitados. Os tais contatos a que Catherine se refere são claramente sexuais. Vale lembrar que Tennessee era gay e assumido. Em várias de suas obras podemos notar o homossexualismo implícito em algum personagem e claro, os distúrbios sofridos pelos mesmos, que pode talvez ser explicada pela perturbada infância do teatrólogo.

Os Desajustados (Misfits, The) - 1961)

[Postado Por Gian] 'Os Desajustados' é um filme marcante por três motivos. Primeiro, ele foi o último filme da carreira de dois lendários artistas do cinema: Clark Gable e Marilyn Monroe. Segundo, ele é o filme que mostra a real capacidade de atuação de Monroe e terceiro, é um filme sólido com um tema bastante forte, principalmente para a época.

O filme dirigido pelo também lendário John Huston (O Tesouro de Sierra Madre, Relíquia Macabra) nos conta a história de Roslyn Taber (Monroe), uma linda mulher que acaba de separar do marido. Após o divórcio, ela e sua amiga Isabelle (Thelma Ritter) conhecem Gay Langland, um típico caubói mulherengo, sem emprego fixo e que caça cavalos selvagens para depois vendê-los aos fabricantes de comida de cachorro. Juntamente com Gay, as duas também conhecem um amigo do caubói, Guido (Eli Wallach) e finalmente outro caubói, Perce (Montgomery Clift), e assim, esse quarteto Monroe-Gable-Clift-Wallach passam a viver uma espécie de triângulo (ou quarteto?) amoroso.

'Os Desajustados' é antes de tudo um filme pessimista. Todas as personagens principais possuem um passado marcado por algo ruim: Roslyn se divorcia devido à indiferença do marido, Gay é separado da mulher e quase não vê os filhos, Guido é um ex-combatente de guerra que perdeu a mulher enquanto ela ainda estava grávida, e Perce é um caubói errante que não possui mais uma carinhosa relação com sua mãe depois da morte do pai. Por causa desses acontecimentos em suas vidas, as personagens estão em constante conflito interno, perdidas no mundo, o título do filme não poderia ser mais apropriado.

Escrito por Arthur Miller, o roteiro é praticamente a personificação da vida de Marilyn Monroe, sua mulher na época. A vida Roslyn se parece muito com a de Monroe, e quem conhece pelo menos um pouco a vida do maior ícone do Cinema, saberá que isso não é mera coincidência, Miller escreveu o papel especialmente para a esposa. Tanto Roslyn quanto Marilyn não tiveram a mãe por perto quando criança, na película dá-se a entender que a mãe de Taber vivia fora de casa por conta de um caso extra-conjugal (3 meses fora de casa é muito tempo para uma criança) e que seu pai fora ausente, já a mãe de Marilyn passou boa parte de sua vida internada em hospitais psiquiátricos, e ela nunca soube a verdadeira identidade do pai, o que levou a pequena Norma Jean a passar vários anos de sua vida em orfanatos. Ambas estão perdidas, Roslyn diz que não sabe o lugar ao qual pertence, e sua intérprete sempre dizia à imprensa que não pertencia a ninguém, apenas ao público (Norma Jean passou a vida toda tentando achar sua 'identidade', e quando se tornou Marilyn Monroe, essa questão se tornou ainda mais difícil); as duas também tiveram um casamento falido (no caso de Marilyn, dois) e por fim, Monroe tinha aversão ao mal tratamento de animais, assim como Roslyn.

Bastante diferente das louras burras que interpretou em filmes como "Os Homens Preferem as Loiras" e "O Pecado mora ao Lado", Monroe nos apresenta uma atuação primorosa, brilhante; talvez pelo fato da personagem ser tão parecida com ela, talvez pelo fato de que em 1961 Marilyn já tinha uma boa bagagem de trabalho, ou talvez pelas duas coisas. A razão realmente não importa, quando a vemos na tela, temos a certeza que Monroe conseguiu chegar aonde ela tanto almejava estar: no mesmo patamar de outras grandes atrizes, e com certeza ela teria ido mais longe, se não fosse pela sua morte prematura em 62. Com um visual mais 'desleixado' (se comparado a seus filmes anteriores) e um pouco mais gordinha (mas sem jamais perder seu natural sex appeal), seu olhar consegue exprimir com perfeição toda a angústia sofrida por Roslyn, mas ao mesmo tempo ela consegue abrir um sorriso, que como diz Gable: "parece que o sol acabou de aparecer". E Monroe era exatamente assim na vida real, sua mente sempre divida por uma linha tênue entre a tristeza e a felicidade, a tristeza vivida por Norma Jean Baker que a todo momento tentava apagar seu triste passado, e a alegria vivida por Marilyn Monroe, que tentou a todo custo mudar completamente de vida tal como mudou seu nome.

Marilyn Monroe não teve muita chance de mostrar do que realmente era capaz, ela já tinha estrelado um drama contundente no início de sua carreira, interpretando uma babá psicótica em 'Almas Desesperadas', apesar do seu bom desempenho, a Fox não aproveitou esse seu lado dramático, deixando-a na maioria das vezes com papéis cômicos (o que ela fez com muita competência, diga-se de passagem), mas por essa razão, ela não era considerada uma atriz que podia ser levada a sério. Marilyn sempre foi muito insegura, não acreditava em seu talento, isso era devido a vários fatores, além de sua falta de confiança natural, sua instrutora dramática, Nathasa Lytess, exercia uma forte pressão sobre ela, a musa só sentia que tinha se saído bem em alguma cena se obtivesse a aprovação de Lytess. Provavelmente essa consideração iria começar depois de 'Os Desajustados', depois que Marilyn já havia se 'livrado' da instrutora e sua confiança para atuar tinha crescido, mas então já era tarde demais.

Entretanto a obra não é só dela, Gable está ótimo como Gay (isso não é um trocadilho), sua personagem faz um ótimo par com a de Monroe, apesar de não ter um emprego ou lar fixo, ele vive tranquilamente, como Gay mesmo fala, ele simplesmente vive e é isso que ele quer que Roslyn sinta, a vida. Num diálogo entre Gay e Roslyn, ele diz: - Nunca vi uma moça tão triste, ela responde, rindo: - Engraçado, os homens sempre me falam ao contrário, e Gay diz: - É porque você os faz sentirem felizes; esse diálogo parece ter sido feito diretamente para Marilyn, Miller a conhecia muito bem, e conseguiu com proeza criar uma personagem baseada em sua esposa.
Montgmery também está muito bem como o caubói que não teme a morte, mas seu papel é um pouco ofuscado, talvez porque a trama se concentra mais no triângulo Roslyn-Gay-Guido. Wallach intrepreta com confiança um homem amargurado pela morte da esposa e pelo

sofrimento pelo qual se viu vítima quando estava na guerra (bombas são como mentiras, você as joga e tudo fica calmo). E destaque também para Thelma Ritter, com seu sotaque do Brooklyn, sua personagem salva o filme do completo pessimismo, cada fala sua é cheia de uma ironia deliciosa (ela já tinha nos deliciado com seus papéis em Janela Indiscreta e A Malvada, uma eterna coadjuvante).

No começo da crítica eu disse que o filme tinha um tema forte, e isso é devido principalmente a descontrução que se faz sobre a insituição do casamento. Roslyn e Gay são separados e a mãe de Perce mudou da água para o vinho depois da morte do marido e quando se casou pela segunda vez, apenas três meses depois (ela parecia uma santa, sempre ao lado do meu pai). Isabelle até comemora os aniversários de seu divórcio e diz que já testemunhou 77 separações, quando Roslyn conta o motivo pelo qual está se separando (eu sinto que ele está lá, mas não posso tocá-lo), ela responde com um tom irônico que se esse fosse o motivo de todo o casal se separar, restariam apenas 11 casais nos E.U.A.

E por fim, temos o grande John Huston, que filma a obra com uma grande habilidade, a cena da perseguição dos cavalos é magnífica, o controle que Huston tinha em cenas filmadas em locais abertos é impressionante (vemos esse controle também em "Uma Aventura na África). O último ato do filme é todo concentrado nessa perseguição que o trio Gay-Guido-Perce faz aos poucos cavalos selvagens que restam, numa paisagem árida, para o desespero de Roslyn. Essa perseguição representa o próprio desajustamento das personagens, tentando prender cavalos com cordas numa paisagem deserta, o espectador percebe que eles próprios estão, de alguma maneira, querendo ser 'amarrados', talvez numa vida mais tranquila.

Por fim, o filme ainda possui um tom macabro pelas personagens sempre estarem falando sobre a morte, em uma cena tocante e linda, Roslyn diz à Guido que as pessoas morrem sem ensinar nada uma às outras (e isso também é condizente com a vida de Marilyn, que passou momentos frustrantes quando as pessoas negligenciavam a sua inteligência), Gay diz que apenas quem tem medo de viver tem medo de morrer, e Guido, por causa da morte da esposa e da sua experiência com a guerra, também faz declarações sobre a dita cuja tão temida. Escrevo sobre esse tom macabro pois Clark Gable morreu onze dias depois do término das filmagens (ataque do coração), Monroe faleceu menos de um ano depois (deixando um filme incompleto), Clift viveu por apenas mais cinco anos e Thelma Ritter nos deixou em 1969.

Possuindo também uma bela fotografia, "Os Desajustados" é uma grande obra, provavelmente o melhor filme de Marilyn Monroe e também um dos melhores de John Huston, imperdível!

Curiosidade: Durante as gravações, Gable "brincava" dizendo que acabaria por morrer de infarto devido aos atrasos crônicos de Marilyn...

A Princesa e o Plebeu (Roman Holliday) - 1953

Mais um filme com essa estonteante atriz e pessoa. Audrey Hepburn brilha pela primeira vez em uma grande produção de William Wyler. O filme é A Princesa e o Plebeu, uma história tão ingênua e simples que só poderia ter ficado na memória daqueles que apreciam uma boa comédia romântica.

A princesa Ann (Audrey Hepburn) está em uma turnê de compromissos políticos pela Europa. Em Roma, saturada de tudo e de todos que rodeiam sua vida “real”, a princesa decide fugir e conhecer a cidade. No entanto, ela havia sido medicada por seu medico com um sonífero e acaba dormindo nas ruas de Roma. Encontrada pelo jovem jornalista americano Joe Bradley (Gregory Peck) ela é resgatada. No dia seguinte, o jornalista descobre quem ela realmente é, e vê ai uma possibilidade de matéria exclusiva com a princesa. Ela, é claro, não iria ficar sabendo de suas intenções.

Joe e Ann passeiam por toda Roma, visitando monumentos e lugares famosos da cidade; e o que era para ser um dia de diversão para ela e mais um dia de trabalho para ele, se torna uma história de romance impossível. Ao final do filme, mesmo sabendo que ele sabe quem ela realmente é, a princesa decide não falar nada, no entanto, o sentimento de perda é mutuo. A cena em que ele a leva de volta a embaixada é realmente tocante “leave me, as i leave you”, para mim, cenas como essa tornam de um filme um clássico.

O filme foi inteiramente filmado em Roma (o que era uma grande coisa na época). A produção foi formidável, a direção foi certa e as atuações esplendidas. Audrey recebeu o oscar de melhor atriz e a partir daí, decolou para outras produções de Hollywood. Mais um filme que eu recomendo.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

O Lutador (The Wrestler) - 2008

[Postado por Gian]A melhor frase que pode definir essa obra de Darren Aronofsky seria: Um filme de grandes atuações! Nesse aspecto, "O Lutador" quase se equipara à filmes como "Quem tem medo de Virgínia Woolf", "Uma Rua Chamada Pecado", "Gata em teto de Zinco Quente" e o mais recente, "Dúvida". Todas essas películas tem em comum a maneira de como conseguem, acima de tudo, conquistar o espectador pelas atuações brilhantes. O filme em questão não possui um roteiro tão original quanto os filmes citados acima, mas ele é triufante ao convencer quem o assiste de que o mais importa é como os atores conduzem essa história, e essa condunção é espetacular!

Randy "Carneiro" Robinson (Mickey Rourke) fez muito sucesso nos anos 80 como um lutador de luta-livre, mas por causa de sua vida sem limites, vinte anos se passam e nós é mostrado o preço pago por Randy por essa vida 'porra-louca': agora ele vive num trailer, luta apenas nos finais-de-semana em pequenos clubes e trabalha num supermercado para complementar sua renda.

Apesar do filme ser divinamente dominado por três atores, é Mickey Rourke que chega ao sublime. Sua vida pessoal se parece com a de Randy, como o lutador, Rourke também teve uma carreira que prometia levá-lo ao patamar das maiores estrelas, entrentanto o ator acabou sendo deixado de escanteio (também por causa de uma vida sem limites) e passou a estrelar, a partir da década de 90, apenas filmes B.

Muitos acham que Rourke só foi elogiado pela sua atuação porque a vida do lutador no filme se confude com a sua própria, afinal ele também tinha se dedicado ao boxe. Mas não é nada disso, sua perfomance é tão brilhante que é impossível pensar que tudo não passou de "um ator derrotado fazendo sua própria vida". Rourke apenas fez as escolhas erradas e com isso acabou por criar nos grandes produtores e diretores uma negligência em relação a ele, passando a impressão de apenas mais um que teve uma carreira passageira, e essa situação, é claro, acontece com vários artistas talentosos.

Analisando o filme pelo filme (que é a melhor maneira de se analisar qualquer forma de arte), temos um ator que nos mostra a verdadeira arte de atuar. Rourke faz de Randy um homem apaixonado pela única coisa que sabe fazer, apesar dos seus dias de glória já terem ido embora há muito tempo. A película é basicamente sobre como uma pessoa pode (ou não) se ajustar na sociedade depois de ter vivenciado uma vida de sucesso. Randy ainda é respeitado nos clubes onde luta e uma vez ou outra é reconhecido na rua, mas isso não basta, o que ele ama é estar rodeado pela sua 'família' (os espectadores das lutas, como ele mesmo diz), entretanto essa família apenas pode ser encontrada em um número bastante reduzido aos finais-de-semana.

Mas a película não gira apenas em torno dele, Marisa Tomei (outra atriz pouco aproveitada) também dá um show ao dar vida a Cassidy, uma stripper que é amiga e affair de Randy, apesar do corpo esbelto, ela já é considerada por muitos 'velha' para os padrões dos clubes de strip-tease, mas ainda assim Cassidy tenta seguir sua vida dançando, apesar de saber que os seus dias de 'glória' já acabaram. Ou seja, temos aqui duas pessoas tentando de alguma maneira continuar simplesmente a serem o que são, tentando fazer com que o tempo não tirem deles seus únicos talentos.
Devido ao rumo que sua vida tomou, Randy possui outro grande problema, que é o de tentar reconquistar a sua filha, ao contrário de Cassidy que apesar de tudo possui seu filho ao seu lado, o lutador procura sua filha (Evan Rachel Wood) com a esperança de uma reconciliação, mas apesar de saber o que precisa para poder conquistá-la, ele falha, e numa comovente cena entre os dois, Randy fala humildemente que sabe que errou, e sabe que continua a errar, ele apenas não consegue deixar de ser o que é, uma sinceridade comovente.
E não podemos esquecer de falar um pouco de Wood, com certeza ela é uma atriz com uma brilhante carreira pela frente, ela mostrou uma ótima perfomance em 'Dúvida' e agora nesse filme ela reforça seu talento, mesmo aparecendo pouco.
Diferente das técnicas mais sofisticadas usadas em "Réquiem para um Sonho" e "Pi", Aronofsk dirige a obra de uma forma quase documental, com a câmera na mão sempre mostrando as costas de Randy, como se ele sempre estivesse pronto a entrar num ringue. A cena que mostra seu primeiro dia como balconista é comovente ao mostrar as costas do lutador e os gritos dos espectadores, nessa cena temos a certeza que o lugar de Randy não é ali, só existe um lugar apropriado para ele, o ringue. As cenas de lutas, apesar de serem de certa forma coreografadas, são magníficas, Rourke consegue passar com tanta verdade a paixão de Randy pela luta-livre, que em nenhum momento sentimos nojo ou asco do esporte praticado (e olha que eu detesto lutas).

Por fim, não se deixe enganar pensando que a obra é apenas mais uma sobre 'luta de boxe', um derivado de Rocky ou Menina de Ouro, ele é muito mais que isso, é uma obra pura e simplesmente sobre um ser humano, que como um verdadeiro exemplar dessa espécie, fez escolhas erradas, se é que pode ser chamado de 'errado' alguém que não consegue deixar de ser o que é.

sábado, 15 de agosto de 2009

Se Meu Apartamento Falasse (The Apartment) – 1960


As obras de Billy Wilder são marcadas por histórias extremamente originais e produções impecáveis. Em “Crepúsculo dos Deuses” (1950) foram usadas pedra poro para empoeirar a antiga mansão de Norma Desmond. O perfeccionismo é lembrado de forma positiva pelos atores que trabalharam com Wilder, afinal de contas papéis fantásticos nasceram de suas mãos.

Se meu apartamento falasse conta a história de Bud Baxter (Jack Lemmon), um funcionário de uma companhia de seguros que empresta a chave de seu apartamento para que colegas da empresa em que trabalha levem garotas, em troca eles prometem a Baxter uma ajuda na promoção. O rodízio da chave pela empresa dá certo até o dia em que seu chefe lhe chama para dizer que sabe do esquema e logo a pede emprestada também. Baxter é promovido de cargo quase que instantaneamente e para comemorar decide sair com Fran Kubelik (Shirley Maclaine), uma encantadora operadora de elevador da empresa.

O filme da uma reviravolta ao descobrirmos que Fran está tendo um caso com o chefe de Baxter, que é casado. Ao abandoná-la no apartamento na noite de natal com falsas promessas de separação, Fran decide por um fim em sua vida: Toma diversos soníferos. Por sorte, Baxter chega em seu apartamento e consegue chamar um médico para cuidar de Fran. Os cuidados e carinhos trocados pelos dois se tornam mutuo e daí surge o amor entre os dois.

O tema da superpolução na cidade de Nova York também pode ser notado no filme. A primeira fala é cheia de números, até chegar ao que representa Baxter. “Em primeiro de novembro de 1959 a população da cidade de Nova York era de 8.042.783 habitantes (...) nossa central tem 31.259 empregados (...) trabalho no 19º andar, departamento de políticas ordinárias, divisão de contabilidade, sessão W, mesa numero 861”. Nova York é uma cidade de anônimos, talvez essa seja a causa de tantos artistas buscarem nela um refugio; Greta Garbo parou de trabalhar aos 40 anos, mudou de nome e se mudou para lá. Uma cidade com tantos atrativos, possibilidades de entretenimento e pessoas para se conhecer tem um dos maiores índices de suicídio do mundo.

O suicídio foi retratado com tanta frieza que eu cheguei a ficar espantado em certa parte da história. Baxter diz à Fran que tentou se matar certa vez, no entanto, apenas atirou em seu joelho acidentalmente. Nas entrelinhas do filme estão a história desses anônimos de Nova York, dentro de pequenos apartamentos que escondem histórias fantásticas. Pessoas comuns, sozinhas e que buscam desesperadamente o sucesso. Quando não alcançado procuram uma solução mais fácil.

O filme ganhou cinco oscars: melhor filme, melhor diretor, melhor roteiro original, melhor direção de arte-preto e branco e melhor edição. Mais do que recomendado é obrigatório aos amantes da 7º arte.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Agora Seremos Felizes (Meet me in St. Louis) - 1944

[Postado por Gian]Os musicais de Minnelli são conhecidos por sua leveza, simplicidade e canções que, ao meu ver, não são muito marcantes, mas não deixam de ser adoráveis. Agora Seremos Felizes é um desses casos, um musical descontraído que tem Judy Garland como seu melhor atrativo.

Vamos a história: Esther (Garland) é uma das quatro irmãs de uma típica família americana, eles vivem em St. Louis e o ano é 1903, ela é apaixonada por seu recém-chegado vizinho e sua irmã mais velha, Rose, está esperando um pedido de casamento, há também a irmã mais nova que parece adorar a cidade mais do que os outros, embora ela consiga ser insuportável na maior parte do filme (tenho a impressão que a dublagem ajudou nessa questão), porém tudo muda quando o chefe da família decide, por razões de trabalho, se mudar para Nova York.

O enredo é bem simples e por se tratar de um musical, consequentemente não é bem desenvolvido. Os filmes musicais de Minnelli tem o desenvolvimento ainda mais simplório do que o esperado, mesmo quando falamos desse tipo de gênero. O romance entre Esther e seu vizinho é bastante sem sal, e não há nenhum conflito propriamente dito. A trama é mais um pretexto para os números musicais, que por sinal são bem agrádaveis, canções como 'Meet Me in St. Louis, Louis', 'Have Yourself a Merry Little Christmas ' e principalmente 'The Trolley Song' fazem a película valer a pena, e claro, a encantadora Judy Garland no auge de sua beleza. Foi nesse filme que Minnelli conheceu a atriz, que se tornaria sua esposa.

Apesar de simplicidade, é impossível não deixar de admirar o charme desse musical da Era de Ouro de Hollywood, assim como outros do diretor: "Gigi", "Sinfonia de Paris" e "A Roda da Fortuna" não são obras-primas, pelo menos não se comparados a obras como "A Noviça Rebelde", "Cantando na Chuva" e "My Fair Lady", (nesses três últimos musicais é possível guardar no mínimo uma canção depois de assistir pelo menos uma vez, o que eu já acho mais difíceis nas produções de Minnelli), mas o espectador sente o amor com o qual essas produções foram feitas, é uma sensação que nunca será sentida nas obras atuais (nem nos musicais), existe uma mágica inexplicável nessa época do Cinema.

É também interessante notar um aspecto histórico no filme: quando a família descobre que irão se mudar para Nova York, ela fica apreensiva pelo fato das pessoas de lá morarem em "apartamentos apertados", bem diferente das casas espaçosas de St. Louis, Nova York já parecia uma 'loucura' em 1903! Imaginem essa família transportada para os dias atuais?

domingo, 2 de agosto de 2009

Aurora (Sunrise: A Song of Two Humans) - 1927

[Postado por Gian]

Aurora é indiscutivelmente uma obra prima, um grande marco, tanto no cinema quanto na carreira do grande diretor F. W. Murnau. Um filme incrivelmente belo, com passagens inesquecíveis e brilhantes atuações.

A década de vinte foi a década do auge dos filmes mudos, onde gênios como Buster Keaton, Charles Chaplin, Murnau e Fritz Lang realizaram várias obras que são considerados obras primas e estão sempre em listas de melhores filmes.

Aurora é um deles. O filme de 1927 é primoroso ao abordar um tema aparentemente simples, mas cheio de emoção. Englobando drama, romance e até comédia, a obra de Murnau nos conta a história de um fazendeiro que se sente atraído subitamente por uma bela jovem da cidade grande, assim que ela descobre que ele é casado, a mulher não pensa duas vezes ao incitá-lo a matar sua mulher, afogando-a. É claro que há um certo absurdo em como a trama se desenrola no começo, como a rapidez com que o fazendeiro aceita a idéia da jovem, porém esses 'detalhes' são perdoados, afinal, o contexto em que eram relaziados os filmes desse tempo não podem nunca ser comparados com o de hoje em dia, o cinema funcionava diferente e pronto.

Mas nada atrapalha o desenrolar do filme, principalmente a partir da cena onde o casal está no barco, simplesmente macabra e arrebatadora, e quando logo depois vem o romance, cada cena filmada por Murnau é cheia de perfeição e sentimento. Eu até discordo da opinião de diretores e atores na época do rebuliço da passagem do cinema mudo para o falado, em que alegavam que o cinema não iria funcionar se adotassem as falas (Charles Chaplin foi um deles), porém ao ver Aurora, nos damos conta de como os dialógos seriam extremamente desnecessários, redundante, aqui o Cinema é pura imagem. A magia de tudo está nas atuações, principalmente na dos atores principais, George O'Brien, o marido, e Janet Gaynor, a esposa (que inclusive ganhou o primeiro oscar de Melhor Atriz!). Juntos, eles entram no hall dos melhores casais do cinema.

Há um certo 'exagero' nas expressões e nos trejeitos dos atores, mas isso era comum na época, esse 'exagero' era para 'compensar' a falta de diálogos, e ainda estamos falando de um filme de Murnau, que usou técnicas do expressionismo alemão para filmá-lo, como nas atuações e na fotografia, bem escura. Cinco anos antes, o diretortinha filmado a também obra prima Nosferatu, onde usou e abusou das técnicas do expressionismo.

Juntando a brilhante direção com as magnifícas atuações, cada cena de Aurora é inesquecível, dou ênfase a quando o marido pede perdão à esposa na igreja, simplesmente um espetáculo! E logo depois as cenas mais românticas que vão se desenrolando também são lindas, cheias de ingenuidade, mas adoráveis. Concordo com o Koball quando disse que algumas cenas cômicas parecem forçadas (no melhor estilo de Hollywood), mas nem isso atrapalha a grande obra que é Aurora.