segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Tootsie (1982)

[Postado por Gian]
Em "Quanto Mais Quente Melhor", a comédia de Billy Wilder considerada a melhor de todos os tempos, dois músicos desesperados (Jack Lemmon e Tony Curtis) se transvestem de mulher e se infiltram em uma banda feminina para fugir de mafiosos. A obra de Wilder merece a primeira posição de melhor comédia que recebeu pela AFI, o filme possui um timing perfeito, com atuações hilárias dos protagonistas e um ótimo enredo. Quase vinte e três anos depois outra comédia com uma vertente bastante semelhante ganharia o segundo lugar na lista, um filme que colocou o diretor Sidney Pollack no hall dos cineastas titulares da época e deu a Dustin Hoffman um dos melhores papéis de sua carreira.

"Tootsie" conta a história de Michael Dorsey (Hoffman), um ator desesperado que não consegue emprego devido ao seu perfeccionismo e excesso de questionamento quanto aos papéis que para ele são dados. Ele mora com seu simpático amigo e escritor de peças teatrais Jeff Slater (Bill Murray) e tem uma amiga, Sandy Lester (Teri Garr), também atriz que sofre por causa de sua insegurança em demasia e confusão de sentimentos. Jeff possui uma promissora peça de teatro no papel, mas não pode ser realizada porque não possui grana para tal empreendimento. Quando o agente de Michael, George Fields (interpretado pelo próprio Pollack) se recusa a ajudá-lo em busca de novos papéis, o ator tem uma idéia luminosa: se transvestir de mulher para estrelar num programa de TV, uma espécie de telenovela médica. Michael agora é Dorothy Michaels, uma mulher de meia-idade que se veste de um modo puritano, mas com idéias revolucionárias para o programa.

Antes da chegada de Dorothy, a telenovela tinha aspectos machistas, mostrando médicos assediando enfermeiras que aceitavam tudo passivamente, principalmente a enfermeira interpretada por Julie Nichols (Jessica Lange). A situação de Julie na vida real não é muito diferente: o diretor da telenovela, Ron Carlisle (Dabney Coleman), é um mulherengo que está envolvido com a atriz, mas não quer nada sério, já Julie, que é mãe solteira, está confusa em relação a Ron, mesmo sabendo seu jeito de ser, ela projeta no diretor a chance de uma vida mais segura e menos solitária. Como era de se esperar, o envolvimento de Srta. Michaels na telenovela e na vida de Julie vai criar uma onda de confusões tremendas, todas repletas de situações inspiradoras e engraçadíssimas.

Enquanto "Quanto Mais Quente Melhor" foi filmado em preto-e-branco (para frustração de Marilyn Monroe) para garantir maior convencimento sobre o aspecto feminino de Lemmon e Curtis – e cenas em cores dos bastidores comprovam que os atores se pareceriam muito mais com palhaços do que com mulheres se o filme não tivesse sido filmado em P&B - Dustin Hoffman convence o espectador com sua Dorothy a cores. Hoffman cria uma perfeita dualidade em sua personagem, misturando aspectos conservadores (como suas roupas, cabelo e trejeitos) com feministas numa atuação engraçadíssima, e é esse feminismo que garantirá sucesso a grande farsa. Em uma época onde o feminismo era repensado dentro do âmbito dos papéis sociais do gênero, Dorothy vira uma representante da mulher americana, suas atitudes determinadas contra o abuso masculino (todas improvisadas, deixando o diretor e os produtores à beira da loucura) servem como inspiração para as mulheres no país afora. Essa transformação para um ícone nacional é feita de uma forma bastante divertida, mostrando Dorothy sendo fotografada para várias capas de revistas encarnando vários papéis, desde uma vaqueira, passando pela pop-art (com direito a posar ao lado de uma sósia de Andy Warhol) até a sua imagem mais conhecida, com um vestido brilhante e vermelho e a bandeira dos EUA ao fundo.

Diferente do sucesso na telenovela, a vida pessoal de Michael fica cada vez mais enrolada. Isso porque ele se apaixona por Julie, que vê em Dorothy uma grande amiga e confidente, e ainda vai ter que lidar com a paixão do pai da atriz por Dorothy, Leslie Nichols (Charles Durning), um homem viúvo e simpático que nem em sonho desconfia da verdadeira identidade de sua amada. Essas situações onde há paixões inusitadas são terrenos-seguro para esse tipo de comédia, se claro, houver um bom entrosamento entre os personagens junto com situações pelo menos aparentemente críveis (como também já vistas na obra de Wilder).

É perceptível a diversão de Hoffman ao interpretar esse papel, tanto que o nome "Tootsie" foi idéia do próprio ator, que era chamado desse jeito por sua mãe quando criança. Enquanto Jack Lemmon se divertia olhando no espelho e se maquiando, Hoffman foi à escola de seu filho vestido de Dorothy para testar a eficácia do disfarce. Jessica Lange levou o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante, e ela está realmente ótima, mostrando toda a insegurança e doçura de Julie. Porém Teri Garr não fica atrás, ela, que também concorreu junto com Lange, faz uma atriz frustrada brilhantemente exagerada, sem ser caricata, gerando assim grande simpatia com o público. A obra ainda conta com as boas participações de Bill Murray e seu sarcasmo natural (ele improvisou todas as suas falas) e Geena Davis.

Com uma direção correta de Sidney Pollack, "Tootsie" se apóia principalmente nas atuações impecáveis e nas situações inteligentes - tão copiadas hoje em dia, que alguns podem vê-lo como um filme cheio de clichês, porém é uma grande comédia, que mescla humor descompromissado com questões mais sérias - como o próprio machismo existente nos programas de TV. Pena que hoje em dia os filmes que exploram homens transvestidos, como "As Branquelas", não sigam o alto padrão da produção de Wilder e de Pollack, ou pelo menos algum padrão aceitável.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Os Sonhadores (The Dreamers) – 2003

1968 - eclodia na França uma rebelião estudantil contra as condições de ensino e por maior participação na vida política. A Universidade de Sobornne era o foco da revolta. Reprimida com violência pela polícia, a manifestação culminou, em 13 de maio, na marcha de 800 mil pessoas em apoio aos estudantes.

É simplesmente fascinante imaginar as centenas de histórias que estavam ocorrendo naquele momento na França. Um momento em que a cultura Pop emergia das mãos de Andy Warhol, a guerra fria assolava o mundo e os “Filhos da Cinemateca Francesa” lançavam a Nouvelle Vague. Em Os Sonhadores, o diretor Bernardo Bertolucci não só retrata esse período histórico para o mundo, como o homenageia, mostrando a história de dois jovens que moravam no epicentro deste vulcão.

Matthew (Michael Pitt) é um jovem americano que vai para França em 68 para estudar o idioma. Cinéfilo, Matthew vai à Cinemateca regularmente, onde assisti a dezenas de filmes. Ok, Devo dar uma parada neste momento para lhes apresentar Henri Langlois. Fundador da cinemateca francesa, era colecionador de filmes e tinha como principal objetivo exibi-los. Muitos diretores dos anos 50 e 60 devem boa parte da sua formação aos filmes que a Cinemateca promoveu. Foi de lá que saíram os “Filhos da Cinemateca” fundadores da Nouvelle Vague (Nova Vaga). Em 68, no entanto, o então ministro da cultura francesa resolveu despedir Langlois da liderança dos destinos da Cinemateca, alegando deficiência de gestão. Em 14 de Fevereiro, a polícia tentou reprimir milhares de pessoas que tentavam chegar ao Palácio Chaillot, sede da cinemateca, onde Langlois contestava as ordens do ministro. Essa é a situação inicial do filme. É nessa, literalmente, Revolução do Cinema que Matthew conhece os irmãos gêmeos Isabelle (Eva Green) e Theo (Louis Garrel).

O jovem fica fascinado com os dois. A química entre os três rola na primeira instancia. A paixão pelo cinema move praticamente todas as suas conversas. Os pais dos gêmeos, estão para fazer uma viagem, e eles convidam Matthew a passar uns dias em sua enorme e antiga casa. Matthew se surpreende ao perceber que a relação dos dois irmão é mais íntima do que imaginava. Os dois dormem todos os dias na mesma cama, nus e abraçados. Jogos de interpretação de cenas tomam conta da primeira parte do filme. Quem não acertava o nome da película em questão, pagava uma “multa”. Em uma delas, Theo se masturba na frente dos dois, e mais pra frente, Matthew tira a virgindade de Isa.

A segunda parte do filme, onde Matthew e Isa estão se relacionando regularmente, Bertolucci explora a relação entre os gêmeos, que se dizem siameses. Chega a ser bizarro, mas curioso o modo como os dois estão unidos e o inicio de um ciúme de Theo por Matthew, que a gente espera terem alguma coisa o filme todo. O ponto forte são de fato, as referencias à outros filmes. No entanto, vemos algo de bastante interessante, o filme foi dirigido bem ao estilo da Nouvelle Vague e as referencias à pop art e a todo o contexto da época nos fazem criar admiração pela película.

É deprimente saber que nos anos 60 existiam jovens motivados a encarar o cinema como uma forma de arte tão profunda quanto a poesia. Discussões sobre filme hoje se resumem a bilheterias e a efeitos visuais. As pequenas partes dos filmes, uma cena, um segundo de uma cena, um olhar, não é mais encarado como uma letra de música pelos cinéfilos de hoje. Ser cinéfilo é amar a um filme tanto quanto um groupie ama uma partezinha de uma música de sua banda. É apreciar o trabalho estético, a edição, tudo. Tudo que motivou àquele roteirista, aquele diretor, aquela pessoa por trás das câmeras a retratar a história.


terça-feira, 10 de novembro de 2009

O Que Terá Acontecido a Baby Jane? (What Ever Happened to Baby Jane?) - 1962

[Postado por Gian]
Hollywood, em sua Era Dourada, possuía um lado no mínimo interessante: a mesma Hollywood que jogava grandes artistas para escanteio em prol de novos talentos e de novas exigências, resgatava alguns e criava verdadeiras obras-primas. Provavelmente o exemplo mor do que acabei de afirmar se encontra no maior filme de Billy Wilder, "Crepúsculo dos Deuses", onde temos uma grande atriz do cinema mudo, Gloria Swanson, que interpreta uma personagem também atriz, da fase muda e que é, como sua intérprete, jogada para escanteio, a inesquecível aloprada Norma Desmond. O mesmo acontece com a obra aqui em questão, "O Que Terá Acontecido a Baby Jane?", que traz duas grandes atrizes, Bette Davis e Joan Crawford que, na época que o filme foi realizado, já não possuíam a glória de outrora.

O filme conta a história de duas irmãs, Baby Jane (Davis) e Blanche Hudson (Crawford) que vivem em uma mansão em Hollywood. Baby Jane foi uma grande estrela mirim e mais tarde tentou carreira no cinema, mas ao contrário do seu sucesso quando criança como cantora e dançarina, não conseguiu emplacar como atriz. Já sua irmã, que não conhecia os louros do sucesso na infância, se tornou uma grande atriz, para a frustração de Jane. Após um trágico acidente, Blanche encerra sua carreira presa numa carreira de rodas aos 'cuidados' da irmã, que envelheceu completamente infeliz, amargurada e psicótica.

A obra de Robert Aldrich é um suspense psicológico de primeira categoria, com tantas características positivas que as pequenas falhas quase não valem a pena ser citadas. Após mostrar, ainda antes dos créditos iniciais, a ascensão de Baby Jane como performista mirim, seu fracasso como atriz contrapondo o sucesso da irmã, e o trágico e misterioso acidente envolvendo as irmãs, somos jogados para dentro da mansão em Hollywood, já no começo dos anos 60 - a época em questão será um fator importante a ser avaliado mais tarde -, onde presenciaremos o desenrolar de uma relação de ódio e rancor.

O primeiro contato que temos com Baby Jane depois dos passar dos anos é chocante, bem diferente da delicada, porém mimada, menina que nos é apresentada no começo da projeção, Baby Jane agora é uma caricatura de si mesma, mantendo as vestes que usava no passado, com direito a babadinhos e laços nos cabelos loiros e secos desgrenhados, o rosto lotado de maquilagem (a brancura excessiva em contraste com o forte lápis preto nos olhos e o batom, juntamente com as marcas do tempo, criam uma imagem quase que icônica), as roupas, quase sempre completamente brancas, conferem a personagem um aspecto fantasmagórico (é fácil lembrar-se de Blanche DuBois, a desequilibrada professora de inglês interpretada divinamente por Vivien Leigh no clássico “Uma Rua Chamada Pecado“), e com trejeitos completamente debochados (essa característica já vinda da própria Bette Davis). É de imediato a compreensão do espectador de estar diante de uma figura ameaçadora, mas ao mesmo tempo digna de pena. Já Blanche, que passa a maior parte do tempo em seu quarto vendo seus filmes constantemente reprisados por um canal de TV, é a imagem da razão e sanidade, ainda que o tempo e os acontecimentos pelo qual passou o tenham deixada com um aspecto visivelmente cansado.

Ambas vivem do passado. Blanche é refém da própria da irmã, todas as suas necessidades básicas precisam ser supridas por Baby Jane, que vê na irmã inválida a oportunidade de se vingar pelo seu fracasso como atriz. Assim sendo, Jane inferniza Blanche das formas mais mesquinhas possíveis, como colocando um rato e um pássaro mortos sob a tampa da bandeja de comida, ou jogando fora todas as cartas dos fãs que chegam para Blanche, seu único vínculo com o passado dourado. Blanche se lembra de seu estrelato através dos filmes, já Jane está completamente ligada a um passado ainda mais remoto, de quando era a estrela do vaudeville, na mansão estão espalhadas quadros e bonecas dessa época, além da patética caracterização já comentada.

Alguns paralelos podem ser feitos entre a obra de Aldrich e a obra-prima de Wilder. A mais evidente de todas é o esquecimento de um grande astro por uma sociedade que a todo o momento pede por mudanças, esse astro passa então a viver em um mundo à parte, quase sem nenhum contato com o exterior. Provavelmente Norma Desmond e Baby Jane Hudson, a primeira em um grau muito maior, desprezam aqueles que um dia as deram oportunidades, apesar da tentativa de ambas de voltar para o show business, Norma através de um fracassado roteirista, e Baby Jane através de um compositor de aspecto bisonho nada promissor. Diferente de Baby Jane, Desmond não vira uma figura cômica, ela mantém a elegância apesar das vestes já estarem um pouco ultrapassadas, entretanto ambas se auto-veneram, a personagem de Wilder espalha por sua mansão fotos da juventude no auge e assiste a seus filmes mudos em seu cinema particular; Jane também tem algumas fotos de sua beleza jovem exótica, mas como sua carreira de atriz não angariou muitos frutos, o que prevalece mesmo são os quadros e as fotos da pequena estrela que fora um dia. Há também, nos dois filmes, um assassinato à sangue frio, que parece ser uma atitude inevitável quando se trata de alguém psicótico que vê sua vida afundando cada vez mais.

Fazendo jus ao gênero em que se enquadra, o filme tem um desenvolvimento lento no primeiro ato, porém à medida que Baby Jane vai se tornando cada vez mais psicótica devido aos acontecimentos que se seguem, como a descoberta que sua irmã pretende vender a casa e depois interná-la, o ritmo se acelera e o espectador se sente cada vez mais envolvido. Sentimos aquele frio na barriga e a inquietação que surgem com cenas aterrorizantes, como as atitudes desesperadas de Blanche por alguma ajuda exterior - do médico da família, da empregada ou da vizinha - que são sempre frustradas pela infeliz aparição da irmã, com cortes de câmeras assustadores voltados para o rosto macabro de Bette Davis. Algumas ‘falhas’ podem ser identificadas quanto à aparente aquiescência de Blanche de se manter como vítima, pelo fato de seu quarto estar bem perto do jardim da vizinha. Sendo assim, quando a situação começa a passar dos limites, Blanche poderia muito bem berrar por socorro, mas se formos pensar por outro lado, além da óbvia fuga da realidade que o filme faz uso para poder se manter, podemos enxergar na personagem de Crawford um sentimento de pena e de carinho em relação à irmã (sentimento esse satisfatoriamente justificado na revelação bombástica ao final da película), ela então prefere deixar a situação como está e torcer pela recuperação da sanidade de Jane.

Bette Davis e Joan Crawford se odiavam na vida real, alguns apontam que Bette Davis era ressentida pelo modo que Joan tinha se tornado uma estrela, Davis teria dito que "Joan Crawford teria dormido com todos os astros da MGM, exceto a Lassie", mas qualquer que fosse as razões, esse rancor só serviu para realçar a carga real do filme. Entretanto é claro que mesmo se as duas fossem amigas do peito, as atuações não poderiam ter sido menos que extraordinárias, afinal, estamos falando de dois gigantes de Hollywood. Joan Crawford consegue transmitir espantosamente o desespero de Blanche ante as situações humilhantes, principalmente através de seu olhar, e Bette Davis vai do cômico ao trágico e da delicadeza a crueldade com uma fluidez e naturalismo impressionantes, as cenas em que canta a triste canção “I’ve Written a Letter to Daddy” despertam no espectador uma mistura de pena com repugnância, e tira-nos um riso culpado quando imita Blanche ao telefone esbugalhando os enormes olhos como uma louca varrida. O elenco coadjuvante também tem seu destaque, principalmente Victor Buono, que interpreta o compositor Edwin Flagg, sua relação com Jane não é completamente clara, às vezes temos a impressão que ele só está interessado mesmo no dinheiro, mas às vezes temos a sensação que há uma atração sexual bizarra e inesperada por parte do músico. O filme também mostra bem a relação nada harmoniosa de Edwin com sua mãe, apesar de pouco tempo na tela.

Lá no começo eu comentei sobre o período em que a história se passa. A Era Dourada de Hollywood já mostrava desgaste no início dos anos 60, perdendo completamente sua força ao final dessa década. Nos anos 70 as produções americanas sofreriam uma reviravolta imensa, com produções mais realistas e se focando em pessoas ordinárias, com o qual o espectador poderia facilmente se identificar. O prelúdio dessa fase tinha surgido com rostos como os de Marlon Brando e James Dean, chamados de 'novos ídolos', apesar de vários atores da mesma época terem continuado a tradição do glamour hollywoodiano, como Elizabeth Taylor e Ava Gardner. No caso de Bette Davis, a atriz não gozava de tanto prestígio por parte dos produtores e diretores já no início dos anos 50, sua carreira fora resgatada em "A Malvada", mas ela não tinha sido sequer a primeira opção para o papel de Margo Channing. Joan Crawford já representava o glamour do passado na década de 50, e no começo da mesma fez uma equivocada declaração: "Não acredito que queiram ir ao cinema para ver alguém que podem ver na rua", referindo-se obviamente a esses novos ídolos. A cena final, na praia, mostra perfeitamente o deslocamento das duas atrizes/personagens, diante da música frenética típica dos anos 60 tocada no rádio e dos jovens na praia com um visual que marcaria a época.

A trilha sonora não é marcante, mas seria um fator desnecessário, não estamos falando de um filme de Hitchcock, onde a trilha sonora exerce um papel quase que fundamental para o impacto de seus melhores filmes (o que seria a cena mais famosa de "Psicose" sem a trilha sonora?), em "Baby Jane" o desenrolar da história por si só já é o suficiente, mas obviamente apoiado por excelentes atuações. “O Que Terá Acontecido a Baby Jane” foi realizado com um orçamento baixo e com duas atrizes que já estavam virando história. Aldrich realizou um trabalho primoroso e produziu um dos melhores suspenses psicológicos da cinematografia americana, mesclando drama, humor negro e suspense. Era Hollywood fazendo uma leitura de si mesma, e com um primor inigualável.

sábado, 7 de novembro de 2009

Café com Leite (2007)


Primeiro curta metragem e filme brasileiro que eu coloco aqui no Blog. Eu não costumo assistir à curtas, mas esse me chamou a atenção pela quantidade de prêmios que ganhou e que continua ganhando (ver abaixo).

O diretor Daniel Ribeiro traz as telas um filme sobre encarar a realidade. Sem por em tema os clichês da maioria dos filmes sobre homossexualismo, que na maioria das vezes trata da aceitação, ele nos mostra a história de Danilo (Daniel Tavares). O jovem está em um relacionamento com Marcos (Diego Torraca) e pronto para sair de casa e finalmente viver a sua vida longe das preocupações de sua família. No entanto, a morte de sua mãe, deixa para ele a responsabilidade de cuidar de seu irmão mais novo, Lucas (Eduardo Melo). Agora ele terá que dividir seu tempo entre namorado de Marcos e pai/irmão de Lucas.

O copo de leite é posto em cena como uma metáfora ao amadurecimento, tanto de Lucas quanto de Daniel. O reconhecimento de Marcos por Lucas, como namorado de Dan é muito interessante. Vemos como as crianças entendem o amor com mais facilidade que os adultos. Destaque de atuação pra Eduardo Melo, uma das crianças que ouviremos falar em um futuro próximo (só esperamos que ele não caia em Malhação).

Finalizando essa curta resenha, indico o filme a todos que querem prestigiar uma película brasileira original e de qualidade.


PRÊMIOS

Prêmio Lente de Cristal de Melhor Curta-Metragem no Brazilian Film Festival of Miami 2008
Urso de Cristal no Festival de Berlim 2008
Prêmio aquisição Canal Brasil no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro 2007
Melhor Ator no Festival de Cinema de Campina Grande 2008
Melhor direção no Festival de Cinema de Campina Grande 2008
Melhor Filme no Festival de Cinema de Campina Grande 2008
Melhor Filme de Ficção no Festival de Cinema de Campina Grande 2008
Melhor Roteiro no Festival de Cinema de Campina Grande 2008
Prêmio Porta Curtas no Festival do Rio 2008
Menção especial no Festival Internacional de Cine y T.V. de Cartagena 2008
Melhor Roteiro no Festival Internacional de Cinema de Itu 2008
Os 10 Mais - Escolha do Público no Festival Internacional de Curtas de São Paulo 2008
Prêmio Moviemobz no Festival Internacional de Curtas de São Paulo 2008
Melhor Ator no Festival Paulínia de Cinema 2008
Melhor direção no Festival Paulínia de Cinema 2008
Prêmio Revelação no For Rainbow - Festival de Cinema da Diversidade Sexual 2008
Melhor Curta - Júri Popular no LesGaiCineMad - Espanha 2008
Diploma Especial - Sunny Bunny no Molodist - International Short-Film Festival - Kiev 2008
Melhor Curta - Júri Popular no Torino Film Festival 2008
Melhor direção no Curta Santos 2008
Melhor direção em Curta-Metragem no Festival de Cinema e Vídeo de Cuiabá 2008
Prêmio VIVO Audiovisual - Melhor Curta-Metragem no Florianópolis Audiovisual Mercosul 2008

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Shortbus (2006)

"Nova York é uma cidade onde as pessoas vão para serem perdoadas"

Este é o filme que provavelmente leva ao extremo variados tipos de sentimentos. O orgasmo (La petite mort, a pequena morte para os franceses) talvez seja o único sentimento realmente físico. O sentimos primeiro e isso afeta o nosso psicológico posteriormente. Não é como a tristeza, em que sentimos as lágrimas em nossa face após uma descarga de emoções em nosso cérebro.

Shortbus é um filme extremamente subestimado, principalmente pelas cenas de sexo explícito quem contém. Elas são de fato as únicas coisas comentadas às pessoas que não o viram, e estas, por sua vez, não o verão por um burro preconceito ou baixarão da internet e verão sozinhas sem falar para ninguém. Eu o assisti em um cinema que fica exatamente em frente à minha casa, famoso por passar filmes europeus e os independentes americanos. Com cinco minutos de filme , um casal de idosos saiu da sala claramente constrangido. Não era para menos, os diferentes orgasmos sendo atingidos de forma explícita e de maneiras variadas (até mesmo um falso) deixaria qualquer um estupefato.

“Nova York é uma cidade de desconhecidos”. Eu provavelmente já ouvi essa frase em pelo o menos três filmes. Embora ela já tenha se tornado um clichê para mim, ela serve de pressuposto crítico a qualquer filme passado em Nova York que eu assisto. E é claro, não são poucos. Desde “Homem Aranha” à “Se meu apartamento falasse”, a premissa é verdadeira. Esse talvez seja o encanto dos diretores e roteiristas pela cidade das luzes. Uma cidade que tudo acontece e aconteceu. Em um ano em que se celebra o quadragésimo aniversario do episódio conhecido como Stonewall, não apenas a luta pelas causas LGBT estão a flor da pele, mas também a luta pela igualdade de todas as minorias. A idéia de um clube Underground formado após o episódio de 11 de setembro que abrigaria essa minoria, mais fragilizada do que o de costume, é no mínimo interessante.

Então vamos à história, ou melhor, às histórias: a terapeuta sexual Sophia (Sook-Yin Lee) conhece o casal Jamie (PH DeBoy) e James (Paul Dawson). Este está considerando abrir o relacionamento sexualmente e Sophia está tendo problemas com seu marido, pois nunca conseguiu ter um orgasmo. Os dois a contam do clube Shortbus, uma válvula de escapa aos nova-iorquinos depois do onze de setembro. James sofre de uma grave crise de identidade que se reflete em uma depressão constante. Ex garoto de programa, está gravando um filme com a finalidade que descobrimos apenas no final. Outra figura importante no filme é a Dominatrix Severen (Lindsay Beamish), que é paga para bater. Ela conhece Sophia no Shortbus e as duas marcam sessões de terapia, na qual uma tenta ajudar a outra: Severen a fazer Sophia finalmente gozar e Sohpia a entender por que Severen não consegue ter um relacionamento sério duradouro. Os “Jamies” encontram um rapaz muito divertido para a abertura do relacionamento. Ceth (Jay Brannan) é um ex-modelo que está a procura desesperadamente de um marido.

Vouyerismo, sadomasoquismo, lesbianismo e mais um tanto de “ismos” fazem parte do contexto do Shortbus. O filme consegue tirar grandes risadas em cenas como a do ovo vibratório, controlado por um controle remoto que Sophia dá à seu marido e, provavelmente, a cena mais comentada do filme, em que em um ménage à trois, James canta o hino dos Estados Unidos na bunda de Ceth. Além de cenas de extrema comoção, como a conversa entre o ex-prefeito de Nova York e Ceth, em que a fala transcrita acima abaixo da foto foi retirada. Além da cena em que James aparece sob a luz, após Jamie já estar perdendo a esperança de encontrá-lo (literalmente e subjetivamente falando).

É difícil classificar Shortbus. Ao ser questionado a respeito da diferença entre a pornografia e o filme, o diretor John Cameron Mitchell disse que “O propósito da pornografia é estimular. Aqui a prioridade é a vida emocional dos personagens”. E está para eu ver um filme que retratou os sentimentos dos personagens tão aguçados quanto este. Sim, através do sexo, mas também da raiva, do constrangimento, da dor, da tristeza, e não deixando o clichê de lado, do amor.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Desencanto (Brief Encounter) - 1945

[Postado por Gian]Antes de dirigir "Lawrence da Arábia", "Doutor Jivago" e "Ponte do Rio Kwai", três das maiores produções cinematográficas já realizadas, David Lean tinha sua carreira concentrada em filmes britânicos, e foi nessa primeira fase, em meio a obras de gângsters e filmes noir produzidos durante a II Guerra, que ele dirigiu "Desencanto". Baseado na peça de Noel Coward, o filme não tem nada a ver com o gênero pelo qual o diretor ficou marcado: o épico, mas em minha opinião, é a sua melhor produção.

"Desencanto" é sobre um romance proibido entre um médico casado e uma mulher, também casada. Laura (Celia Johnson) é uma típica mulher dos anos 40, boa mãe e boa esposa. Entretanto, ao invés de focar sua vida apenas no marido e nos filhos, ela tem os seus momentos privados, mais precisamente todas as quintas-feiras, quando pega um trem e vai até outra cidade fazer compras, ler um bom livro e ir ao cinema, geralmente sozinha. Tudo está maravilhosamente bem até o dia em que ela está na estação de trem esperando-o para voltar para casa e, por causa de um cisco de carvão em seu olho, conhece o charmoso clínico geral Alec Harvey, que a liberta de seu pequeno incômodo. Após o incidente, os dois acabam por se encontrarem acidentalmente em outras ocasiões, e depois de um almoço inocente aqui e um cineminha ali, inevitavelmente se apaixonam.

A obra de Lean é fascinante, a começar pelo modo narrativo, em flash-back. Assim como em "Cidadão Kane", logo no começo do filme já nos é mostrado o final da obra, um desfecho triste da história de amor do casal, e é a partir desse final, que consegue transmitir uma carga dramática altíssima mesmo o espectador não sabendo exatamente o que está por vir (a genialidade se encontra nesse fator), que o enredo se desenrola, todo através da imaginação de Laura, que relembra os acontecimentos como se tivesse contando-os para seu amoroso e inocente marido, uma vontade de ser sincera que tenta reprimir a qualquer custo.

Além da narração relativamente fora do convencional, "Desencanto" possui uma fluidez de filmagem maravilhosa. Nunca ficamos cansados com o enredo, o filme é sim um melodrama, mas um melodrama de alto nível. Cenas como a de Laura rindo aliviada depois de uma conversa com seu marido (quando ela pensa que seu encontro com Alec não significou nada demais), ou quando seu amante está contando seus sonhos como profissional na área da Medicina Preventiva são muito prazerosas de se assistir. As passagens de amor entre Laura e Alec são puramente críveis, Lean nos faz sofrer com esse amor impossível e, ao concentrar boa parte da obra em uma estação de trem, sentimos a sensação de urgência e conseqüentemente de perigo iminente devido ao barulho da locomotiva e a sua pontualidade que, por causa da situação do casal, é absurdamente irritante. A obra também é focada mais no sofrimento de Laura, apenas sabemos um pouco da vida de Alec através de sua amante. Dentro outros motivos, esse foi um que fez com que a película fosse tachada, na época, como 'filme de mulher'.

Os atores principais nos presenteiam com atuações primorosas. Celia Johnson, na cena já comentada, deixa o espectador avisado sobre todo o sofrimento pelo qual o casal passou em poucas semanas, através de seu olhar, ao mesmo tempo confuso, desesperado e apaixonado, e com contrações nervosas da boca, uma sutileza de tirar o chapéu, além de sua voz doce, porém pesarosa. Trevor Howard faz o seu melhor ao dar vida a um médico sonhador e perdidamente apaixonado. O elenco coadjuvante dá um toque mais leve ao filme, especialmente a personagem interpretada por Joyce Carey (ela já havia atuado em outro filme de David Lean, "Nosso Barco, Nossa Alma), que trabalha na aconchegante cafeteria da estação, e seu affair interpretado pelo carismático Stanley Holloway (o divertido e simpático Alfred P. Doolittle de "Minha Bela Dama"), apesar da história entre os dois não acrescentar nada à trama ao não ser mesmo o alívio cômico. Cyril Raymond, o marido de Laura, também brilha em seus poucos momentos na tela. Por falar em cafeteria aconchegante, os cenários são bastante caprichados, destaque para a sala da casa de Laura e as cenas dentro do cinema (que serve como uma deliciosa curiosidade para os cinéfilos de plantão).

A direção de David Lean é segura, nunca se sobrepondo aos atores, pelo contário, ele tira o melhor deles. Filmado em preto e branco, Lean faz um belo contraste entre o claro das ensolaradas cenas matutinas (onde geralmente os amantes estão felizes, passeando de barco ou dirigindo por uma estrada), e o escuro, nas cenas da estação, como já dito, onde há sempre a sensação de urgência, e desespero devido principalmente ao peso na consciência da protagonista. Apesar do fator melodramático, os diálogos não são irritantemente melosos, pelo contrário, tudo é muito próximo do real, fazendo com que cada frase de Laura e Alec soe irreprochável.

“Desencanto” é um verdadeiro clássico, infelizmente pouco conhecido pelo grande público. De uma forma ou de outra, os épicos de Lean acabaram por ofuscar suas obras ‘menores’, mas não menos impactantes. Junto com "A Princesa e o Plebeu" (Billy Wilder), os filmes formam os dois maiores exemplos de uma obra sobre amor proibido de Hollywood.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Clamor do Sexo (Splendor in the Grass) 1961

[Postado Por Gian]Elia Kazan é um dos maiores diretores norte-americanos de todos os tempos, suas obras são magníficas, abordando sempre temas polêmicos e relevantes.

Citando alguns de seus melhores trabalhos, "A Luz é Para Todos" aborda o anti-semitismo, trazendo Gregory Peck como um jornalista que se passa por um judeu; "Sindicato de Ladrões" tem um tema político, estrelando Marlon Brando como um ex-boxeador que luta contra um sindicato de corruptos; "Vidas Amargas" retrata o drama de um jovem (James Dean) e sua dificuldade de relacionamento com o pai e "Uma Rua Chamada Pecado", com certeza o seu filme com o maior peso dramático, é a película com aspectos bastante semelhantes ao filme criticado aqui, sexualmente falando.

"Clamor do Sexo", depois de "Uma Rua", é o filme mais polêmico de Kazan. Os belíssimos Bud (Warren Beatty) e Deani (Natalie Wood) são jovens que formam um casal apaixonado no final dos anos 20, um ano antes da Grande Depressão. Bud é herdeiro de uma grande companhia de petróleo, já Deani é filha de um doceiro, mas a diferença econômica não é nem de longe o principal fator que vai interferir em seu relacionamento. E qual é então o fator principal? O simples e puro desejo sexual. Ora, estamos falando dos anos 20, uma época em que uma garota 'de família' não podia nem cogitar a idéia de transar com seu namorado antes do casamento, por mais que o desejo aflorasse. Na verdade, o desejo da mulher tinha que ser totalmente reprimido, como diz a mãe de Deani à filha: - Só fazemos essas coisas para satisfazer os nossos maridos, para reprodução. A mulher não sente tanta vontade quanto o homem. Com esse diálogo, vemos que realmente muita coisa mudou em menos de cem anos, e a década de 20 seria o ponto de partida para as grandes mudanças ocorridas nesse século.

Devido à essa repressão sexual, Bud começa a ficar cada vez mais e mais frustrado, ele ainda tem que enfrentar o dilema entre ir para faculdade e casar com Deani só depois da graduação, ou continuar na cidade e trabalhar como fazendeiro. Ele também sofre uma forte pressão por parte de seu pai, que deseja ter um filho estudado, típicos dilemas da época que ainda persistem de alguma forma. Para completar, Bud tem uma irmã que é a ovelha negra da família, o oposto de Deani, ela não liga para o que os outros pensam e não tem medo de satisfazer seus desejos, em 1928, uma verdadeira promíscua.

As atuações são um dos maiores pontos fortes do filme, e não era de se esperar por menos, vindo de um verdadeiro diretor de atores. Em "Uma Rua Chamada Pecado", Marlon Brando e Vivien Leigh dão um show de intepretação, nesse o desejo sexual entre os dois é claro e confuso ao mesmo tempo, não há amor entre os dois, apenas um desejo carnal e um ódio espiritual. O diretor também tira o melhor de James Dean em um de seus únicos três filmes, Dean é mais que convincente na pele de um jovem atormentado por sua família. Estudante ilustre do Método Strasberg, Kazan desenvolveu com seus atores (principalmente Dean e Brando, esse último consagrado em "Uma Rua") um modo peculiar (para a época) de interpretação: falando de uma maneira mais superficial, o método consistia em fazer com que o ator resgatasse sentimentos (bons ou ruins) de seu passado e assim usá-los em prol do papel que estaria interpretando; um método muito controverso, recebendo pesadas críticas de grandes atores como, por exemplo, o shakesperiano Laurence Olivier, mas isso é outra história.

Em "Clamor", ele dá para Warren Beatty o seu primeiro papel de destaque, e o jovem ator se sai muito bem, mas é Natalie Wood, que já tinha provado ser uma grande atriz no eterno musical "Amor, Sublime Amor" e em "Juventude Transviada, que rouba o filme. A sua depressão gradativa por conta do afastamento de Bud (seu desejo fala mais alto e ele vai procurar outra garota para satisfazê-lo) é impressionante. Esse aspecto não deixa de ser um pouco forçado por parte de Willian Inge, o roteirista, que exagera melodramaticamente ao internar Deani num hospício. O exagero é ainda maior, pois não nos é mostrado claramente o afastamento do casal, quando percebemos, Deani já está berrando histericamente na banheira de sua casa, ainda bem que Wood trabalha com muita competência, e assim acaba nos convencendo e tornando tudo o mais próximo do real. O elenco mais velho também está ótimo, destaque para Pat Hingle que interpreta "Bud's old man", Hingle possuía um carisma natural mesmo quando interpretava personagens mais duros, como o "Old Man" em "Gata em Teto de Zinco Quente".

Um paralelo interessante pode ser feito com "Vidas Amargas" no que diz respeito à relação pais e filhos, em "Vidas" o sofrimento do joven interpretado por James Dean é diretamente proporcional à indeferença do pai; já em "Clamor" não há culpados, a mãe de Deani apenas a criou como a sua mãe a tinha criado, e assim sucessivamente (um fator explícito na obra em um belo diálogo), era simplismente a cultura da repressão sexual que predominava nas famílias.

A partir daí o romance acaba e o enredo segue outro rumo. Bud decide-se por ir à faculdade, mas não consegue terminar nem o primeiro ano devido ao seu desajustamento no ambiente acadêmico (- Sempre achei que não são todos que devem frequentar uma universidade, diz o reitor de Yale). Deani se apaixona por um jovem no centro psiquiátrico e quando entramos em 29, a crise financeira mundialmente conhecida afeta às duas famílias, causando um dano trágico para uma delas. Mesmo que parte da tragédia da película seja por conta dessa crise (outro aspecto mal explorado, ainda que não seja o tema principal), é impossível não termos a impressão que todos os acontecimentos são desencadeados pela repressão sexual dos jovens. As frustrações, os medos, as inseguranças, tudo é aumentado por causa disso, no começo de um século que mudaria completamente o jeito de pensar do Ocidente.

Com uma direção correta, filmando algumas cenas com ângulos fora do tradicional (mas já usados em "Vidas"), Kazan é ousado em dirigir uma obra com temas fortes e pouco mostrados no Cinema ainda nos anos 60. Essa década serviu como caminho para o Cinema da década seguinte, que definiria os padrões da Sétima Arte até hoje, os anos 60 estavam aos poucos se libertando das amarras, abandonando as ingenuidades e hipocrisias dos anos anteriores, como o Código Hays (que afetou drasticamente o roteiro original de obras como "O Pecado Mora ao Lado", por exemplo). Um clássico importante tanto no seu aspecto artístico quanto histórico.


"What though the radiance which was once so bright
Be now for ever taken from my sight,
Though nothing can bring back the hour
Of splendour in the grass, of glory in the flower;
We will grieve not, rather find
Strength in what remains behind..."